BRASÍLIA – A Polícia Federal (PF) indiciou o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil-MA), sob suspeita dos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção iva, em inquérito que apura desvios de recursos de obras de pavimentação custeadas com dinheiro público da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), estatal controlada pelo Centrão.
Por meio de nota, Juscelino Filho disse que o indiciamento é "político" e reclamou de "vazamentos seletivos". "A investigação, que deveria ser um instrumento para descobrir a verdade, parece ter se desviado de seu propósito original. Em vez disso, concentrou-se em criar uma narrativa de culpabilidade perante a opinião pública, com vazamentos seletivos, sem considerar os fatos objetivos. O indiciamento é uma ação política e previsível, que parte de uma apuração que distorceu premissas, ignorou fatos e sequer ouviu a defesa sobre o escopo do inquérito".
O esquema, segundo a investigação da PF, envolve irregularidades em obras executadas em Vitorino Freire (MA), cidade governada por Luanna Rezende, irmã do ministro, e bancadas por emendas parlamentares indicadas por ele, no período em que atuava como deputado federal.
Relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) mostra que uma das obras beneficiou propriedades da família de Juscelino Filho. O documento integra o relatório final da PF, que foi remetido ao ministro Flávio Dino, relator do inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF).
A investigação teve início para apurar suspeitas de desvios em obras da Codevasf, principalmente as executadas pela Constrvice, cujo sócio oculto, segundo a PF, é o empresário Eduardo José Barros Costa, conhecido como Eduardo DP. A PF encontrou, no celular do empresário, mensagens trocadas entre ele e Juscelino.
A Folha de S. Paulo revelou, em maio de 2022, diálogos de Eduardo DP e Juscelino Filho tratando da execução de obras e destinação das emendas. O jornal mostrou que a empreiteira chegou a aparecer como a vice-líder em licitações da Codevasf e usou laranjas para participar de concorrências públicas na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A reportagem revelou também que as mensagens analisadas no inquérito, conforme um relatório da PF, reforçam a “atuação criminosa de Juscelino Filho” e demonstram que a “sua função na Orcrim (organização criminosa) era conhecida por todos os membros” do suposto grupo chefiado por Eduardo DP.
“Resta cristalina a relação criminosa pactuada entre Juscelino Filho e Eduardo DP”, diz trecho de relatório da PF. De acordo com o documento em que a PF pediu busca contra Juscelino Filho, o grupo do ministro foi responsável por “suposto desvio ou apropriação e uso indevido de, no mínimo, R$ 835,8 mil”.
Ainda segundo a Folha, ao longo da apuração, a PF mapeou três caminhos usados para desviar valores de contratos da Codevasf para o ministro. Eles envolvem a pavimentação de estrada que beneficiava propriedades de Juscelino, as indicações de pagamentos a terceiros e a contratação de uma empresa que a PF suspeita ser do ministro.
A irmã do ministro foi alvo de busca e apreensão em setembro de 2023 durante a investigação. A PF também pediu busca contra Juscelino, mas o então relator do caso, o ministro Luís Roberto Barroso, negou o pedido. O ministro de Lula teve os bens bloqueados.
Em julho de 2022, a PF prendeu Eduardo DP na primeira fase da operação Odoacro e ou o celular do empresário, quando os diálogos com Juscelino foram encontradas. O empresário foi solto dias depois.
A segunda fase da Odoacro, deflagrada em outubro do mesmo ano, mirou Julimar Alves da Silva Filho, que era fiscal da Codevasf e foi afastado do órgão sob suspeita de ter recebido R$ 250 mil de propina da Constrvice.
Segundo a PF, Julimar era um “tentáculo” de Juscelino na Codevasf para fazer os desvios. “Para conseguir gerir e desviar os recursos, Juscelino Filho e ‘Eduardo DP’ possuem tentáculos dentro da Codevasf, como o fiscal afastado na segunda fase da operação Odoacro, Julimar Alves da Silva Filho", diz a polícia, em relatório.
O inquérito é relatado por Flávio Dino no STF porque ele recebeu os processos do acervo de Rosa Weber. A ministra, agora aposentada, por sua vez, herdou o caso Barroso quando o ministro virou presidente do STF.